O Locus da política

Durante muitos séculos a política esteve no centro das reflexões e das decisões. Em razão disso a ação política administrou a economia, ou seja, a economia era um dos campos em que ocorria a atuação política.

Essa afirmação pode ser aplicada, ao longo da história, aos diferentes modos de produção. Desde o chamado Modo de Produção Asiático, passando pelo escravista greco-romano até o modo de produção feudal, em todos eles teremos as ações e decisões políticas interferindo nos rumos da economia. O encaminhamento político fundamenta-se nas decisões dos monarcas ou seus congêneres que representam o que se pode chamar de Estado.

Em todos esses momentos históricos podemos observar a centralidade da política. Podemos observar, inclusive, a centralidade não só do Estado como da vontade de personagens marcantes e decisórios. A economia Mesopotâmica e Egípcia mantinham relação com a pessoa do monarca. Ele era uma espécie de grande proprietário de tudo e todos dele dependiam. E nisso se caracteriza o que chamamos de Modo de Produção Asiático. Ou seja, o monarca centralizava todas as decisões e todas as propriedades eram do monarca. Podemos dizer, inclusive, que o desenvolvimento econômico dependia da vontade do governo. A vida nacional, podemos dizer, dependia do monarca. Era a partir desse personagem que aconteciam os avanços ou tropeços de cada nação, de cada povo. O Estado era personificado no monarca.

A mesma afirmação pode ser feita em relação ao período greco-romano e naquele que se convencionou chamar de Idade Média, e no Modo de Produção Feudal em que a economia estava sujeita à atuação não só dos monarcas como dos senhores feudais. Nesse caso ainda podemos ver a centralidade da política sobrepondo-se à economia. Tanto isso é verdade que as relações econômicas medievais eram quase nulas ou baseadas, quase que exclusivamente, na troca. Em contrapartida as ações políticas – relação entre feudos ou seus senhores – dependia desses senhores. Noutras palavras, podemos dizer que até o final da Idade Média os rumos da economia estavam subordinados às vontades dos lideres políticos. Era na política que se fundamentavam as decisões e mecanismos de organização da economia.

Isso se explica, entre outros elementos, pelo fato da centralidade do poder não com um aparato de Estado, mas na vontade de um governo, normalmente, hereditário.

Esse quadro mudou com o processo renascentista e se solidificou com as revoluções Francesa e Industrial, mediante a disseminação dos ideais do liberalismo. O liberalismo cria – ou inverte – uma nova perspectiva para a política e a economia. Desloca-se a centralidade das decisões. A burguesia que começara a nascer séculos antes se apropriou do poder político, a partir do processo da Revolução Francesa. A burguesia passou a dar as coordenadas para as ações dos governos que se sucederam, sendo a maioria deles não mais monárquicos, mas republicanos. Com isso podemos dizer, sem entrar no mérito da discussão de teorias políticas, que o processo de supressão dos regimes monárquicos foi, ao mesmo tempo, o processo de instalação dos estados republicanos. E estes inverteram a ordem, colocando a política sob o gerenciamento da economia.

A partir desse processo histórico (Renascimento, Revolução Francesa e Industrial) a economia passou a ser central nas decisões e nas ações políticas. Ou seja, a economia se sobrepôs à política, fazendo com que a vida e as ações políticas passassem a ser definidas pelos rumos da economia.

A título de exemplo olhemos para o que se chamou de processo das “grandes navegações”. Essa epopéia não nasceu de uma decisão política, mas foi uma exigência econômica. A falta de mecanismos para a manutenção do comércio – aspecto econômico – com o oriente forçara os monarcas ibéricos a uma decisão política com perspectiva econômica: navegar. “Navegar é preciso” não por que isso implicava em aventuras, ou conquistas românticas de novas terras, mas porque a economia assim o exigia. A perspectiva de riqueza se ampliava, com as navegações. Assim, a decisão política de cruzar os “mares nunca dantes navegados” se fundamentou numa exigência econômica.

Essa perspectiva se solidificou com os dois processos revolucionários (Francesa e Industrial), a partir dos quais, as decisões políticas passaram a ter como ponto de origem e de chegada as necessidades da Burguesia. A necessidade da burguesia era de agilizar as decisões políticas levou-a a destituir a nobreza do poder, colocando a lucratividade como princípio e motor da política. Para isso burguesia estruturou-se o sistema republicano pelo qual o poder é exercido por representantes eleitos.

Nisso está o principal ponto da transformação operado pela burguesia, em relação ao modelo anterior. O fato do poder não ser hereditário, mas exercido por eleição, deu nova configuração à atuação política. Elege-se aquele que possuiu maior poder ou sustentação econômica.

Essa nova configuração produziu as manifestações políticas atuais, em que o representante elege-se em nome da população, mas financiado por grupos específicos. Dessa forma o representante eleito, apesar de nominalmente e juridicamente representar os eleitores, de fato faz aquilo para o que os seus financiadores lhe deram o poder: cria condições para que os grupos que lhe financiaram a eleição lucrem.

Esse panorama explica não só as mazelas e escândalos políticos que vemos ocorrer, cotidianamente, mas também a falta de resposta para as necessidades da população. Ou seja, os serviços públicos que deveriam beneficiar a população, não funcionam porque não são do interesse de quem financiou a campanha.

A ação política submeteu-se aos interesses econômicos e estes direcionam as atividades e decisões políticas.

 

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