Cícero (106a.C-43 a.C.)

Marco Túlio Cícero, em latim Marcus Tullius Cicero (Arpino, 3 de Janeiro de 106 a.C. — Formia, 7 de Dezembro de 43 a.C.), foi um filósofo, orador, escritor, advogado e político romano.

Cícero é normalmente visto como sendo uma das mentes mais versáteis da Roma antiga. Foi ele quem apresentou aos Romanos as escolas da filosofia grega e criou um vocabulário filosófico em Latim, distinguindo-se como um linguista, tradutor, e filósofo. Um orador impressionante e um advogado de sucesso, Cícero provavelmente pensava que a sua carreira política era a sua maior façanha. Hoje em dia, ele é apreciado principalmente pelo seu humanismo e trabalhos filosóficos e políticos. A sua correspondência, muita da qual é dirigida ao seu amigo Ático, é especialmente influente, introduzindo a arte de cartas refinadas à cultura Europeia. Cornelius Nepos, o biógrafo de Ático do século I a.C., comentou que as cartas de Cícero continham tal riqueza de detalhes "sobre as inclinações de homens importantes, as falhas dos generais, e as revoluções no governo" que os seus leitores tinham pouca necessidade de uma história do período.[1]

Durante a segunda metade caótica do século I a.C., marcada pelas guerras civis e pela ditadura de Júlio César, Cícero patrocinou um retorno ao governo republicano tradicional. Contudo, a sua carreira como estadista foi marcada por inconsistências e uma tendência para mudar a sua posição em resposta a mudanças no clima político. A sua indecisão pode ser atribuída à sua personalidade sensível e impressionável: era propenso a reagir de modo exagerado sempre que havia mudanças políticas e privadas. "Oxalá que ele pudesse aguentar a prosperidade com mais auto-controlo e a adversidade com mais firmeza!" escreveu C. Asínio Pólio, um estadista e historiador Romano seu contemporâneo.[2][3]

Vida pessoal

Primeiros anos

Cícero nasceu em 106 a.C. em Arpino, uma cidade numa colina, 100 quilómetros a sul de Roma. Por isso, ainda que fosse um grande mestre de retórica e composição Latina, Cícero não era "Romano" no sentido tradicional, e sempre se sentiu envergonhado disto durante toda a sua vida.

Durante este período na história Romana, se alguém quisesse ser considerado uma pessoa com cultura, era necessário falar Grego e Latim. A classe alta Romana até preferia usar a língua Grega em correspondência privada, sabendo que tinha expressões mais refinadas e precisas, era mais subtil, e em parte por causa da grande variedade de nomes abstractos. Cícero, como a maioria dos seus contemporâneos, foi educado com os ensinamentos dos antigos filósofos, poetas e historiadores gregos. Os professores mais proeminentes de oratória na altura também eram Gregos.[4] Cícero usou o seu conhecimento da língua Grega para traduzir muitos dos conceitos teóricos da filosofia grega em Latim, apresentando-os desta forma a uma maior audiência. Foi precisamente a sua educação que o ligou à elite Romana tradicional.[5]

O pai de Cícero era um rico equestre com bons contactos em Roma. Apesar de ter problemas de saúde que o impediam de entrar na vida pública, compensou por isto ao estudar extensivamente. Apesar de pouco ser conhecido sobre a mãe de Cícero, Hélvia, era comum as mulheres de importantes cidadãos Romanos serem responsáveis pela casa. O irmão de Cícero, Quinto, escreveu uma carta a dizer que ela era uma dona de casa frugal.[6]

O cognome de Cícero em Latim significa grão-de-bico. Os Romanos normalmente escolhiam sobrenomes realistas. Plutarco explica que o nome foi originalmente dado a um dos antepassados de Cícero porque ele tinha uma covinha na ponta do nariz que parecia um grão-de-bico. Plutarco diz também que foi dito a Cícero para mudar este nome depreciativo quando ele decidiu entrar na política, mas que este recusou, dizendo que ele ia fazer Cícero mais glorioso do que Escauro ("com tornozelos inchados") e Catulo ("Cachorrinho").[7]

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Jovem Cícero a ler, fresco de 1464, atualmente naColecção Wallace.

De acordo com Plutarco, Cícero era um estudante extremamente talentoso, cuja aprendizagem atraiu a atenção de toda a Roma,[8] dando-lhe a oportunidade de estudar a lei Romana sob Quinto Múcio Cévola.[9] Outros estudantes eram Caio Mário, o Jovem, Sérvio Sulpício Rufo (que se tornou advogado, um dos poucos que Cícero considerava serem superiores a ele próprio em assuntos legais), e Tito Pompónio. Os dois últimos tornaram-se amigos de Cícero por toda a vida, e Pompónio (que mais tarde recebeu o apelido de "Ático" por causa do seu amor pela cultura helénica) iria ser o maior conselheiro e suporto emocional de Cícero.

Cícero queria seguir uma carreira no serviço público civil nos passos do Cursus honorum. Em 90 a.C.–88 a.C., Cícero serviu Cneu Pompeu Estrabão e Lúcio Cornélio Sula durante a Guerra Social, apesar de não ter interesse nenhum na vida militar. Cícero era, antes de tudo, um intelectual. Cícero começou a sua carreira como advogado a cerca de 83-81 a.C. O seu primeiro caso importante de que se tem registo aconteceu em 80 a.C., e é a defesa de Sexto Róscio, acusado deparricídio.[10] Aceitar este caso foi um acto corajoso: parricídio era considerado um crime horrível, e as pessoas acusadas por Cícero, o mais famoso sendo Crisógono, eram favoritos do ditador Sula. Nesta altura, teria sido fácil para Sula mandar alguém assassinar o desconhecido Cícero. A defesa de Cícero foi um desafio indirecto ao ditador, e o seu caso foi forte o suficiente para absolver Róscio.

Em 79 a.C., Cícero partiu para a Grécia, Ásia Menor e Rodes, talvez devido à ira potencial de Sula.[11] Cícero viajou para Atenas, onde se encontrou de novo com Ático, que se tinha tornado num cidadão honorário de Atenas e apresentou Cícero a alguns Atenienses importantes. Em Atenas, Cícero visitou os lugares sagrados dos filósofos. Mas antes de tudo, ele consultou retóricos diferentes para aprender um estilo de falar menos exaustivo. O seu maior instrutor foi Apolónio Mólon de Rodes. Ele ensinou a Cícero uma forma de oratória mais expansiva e menos intensa que iria caracterizar o estilo individual de Cícero no futuro.

No fim dos anos 90 e inícios dos 80 a.C., Cícero apaixonou-se pela filosofia, o que iria ter grande importância na sua vida. Eventualmente, ele iria introduzir a filosofia grega ao romanos e criaria um vocabulário filosófico latino. Em 87 a.C., Filão de Larissa, o chefe da Academia fundada por Platão em Atenas 300 anos antes, chegou a Roma. Cícero, "inspirado por um extraordinário zelo pela filosofia",[12] sentou-se entusiasticamente aos seus pés e absorveu a filosofia de Platão, chegando a dizer que Platão era o seu deus. Admirava especialmente a seriedade moral e política de Platão, mas também respeitava a sua imaginação. Mesmo assim, Cícero rejeitou a teoria das Ideias dele.

Família

Cícero provavelmente casou-se com Terência quando tinha 27 anos, em 79 a.C. De acordo com os costumes da classe alta da época, era um casamento de conveniência, mas existiu harmoniosamente durante uns 30 anos. A família de Terência era rica, mas embora tivesse origem nobre, tinha ligações familiares com a plebe, eram os Terenti Varrones, e preenchendo os requerimentos das ambições políticas de Cícero em termos ambos económicos e sociais. Ela tinha uma meia-irmã (ou talvez prima) chamada Fábia, que em criança se tinha tornado numa virgem vestal, o que era uma grande honra. Terência era uma mulher independente e (citando Plutarco) "tinha mais interesse na carreira política do marido do que o deixava a ele ter nos assuntos da casa".[13] Era uma mulher pia e provavelmente com os pés bem realista.

Nos anos 40 a.C., as cartas de Cícero a Terência tornaram-se mais curtas e frias. Ele queixou-se aos amigos que Terência o tinha traído, mas não explicou em que sentido. Talvez o casamento simplesmente não pudesse aguentar a pressão do tumulto político em Roma, o envolvimento de Cícero nele, e várias outras disputas entre os dois. Parece que o divórcio aconteceu em 45 a.C. No fim de 46 a.C., Cícero casou-se com um jovem moça patrícia, Publília, de quem ele tinha sido o guardião. Pensa-se que Cícero precisava do dinheiro dela, especialmente depois de ter de pagar de volta o dote de Terência.[14] Este casamento não durou muito tempo.

Apesar do seu casamento com Terência ter sido um de conveniência, sabe-se que Cícero tinha grande afeição pela sua filha Túlia.[15] Quando ela ficou doente subitamente em fevereiro de 45 a.C. e morreu depois de aparentemente ter recuperado de dar à luz em Janeiro, Cícero ficou arrasado. "Perdi a única coisa que me ligava à vida" escreveu ele a Ático.[16] Ático disse-lhe para o visitar durante as primeiras semanas depois deste evento, para que ele o pudesse consolar. Na grande biblioteca de Ático, Cícero leu tudo o que os filósofos gregos tinham escrito sobre como vencer a tristeza, "mas a minha dor derrota toda a consolação."[17] Júlio César, Bruto e Sérvio Sulpício Rufo mandaram-lhe cartas de condolência.[18][19]

Cícero esperava que o seu filho Marco se tornasse num filósofo como ele, mas Marco queria uma carreira militar. Ele juntou-se ao exército de Pompeu em 49 a.C. e depois da derrota de Pompeu na Farsália em 48 a.C., foi perdoado por Júlio César. Cícero enviou-o para Atenas para estudar como um discípulo do filósofo peripatético Cratipo em 48 a.C., mas o jovem usou a ausência "do olho vigilante do seu pai" para "comer, beber e ser feliz."[20] Depois do assassinato de Cícero, ele juntou-se ao exército dos Liberatores, mas foi mais tarde perdoado por Augusto dos Júlios. Os remorsos de Augusto por ter posto Cícero na lista de proscrição durante o segundo triunvirato fê-lo dar considerável ajuda à carreira de Marco, o filho de Cícero. Este tornou-se num áugure, e foi nomeado cônsul em 30 a.C. juntamente com Augusto, e mais tarde feito procônsul da Síria e da província da Ásia.[21]

Obras

Cícero foi declarado um pagão justo pela Igreja católica, e por essa razão muitos dos seus trabalhos foram preservados. Santo Agostinho e outros citavam os seus trabalhos "De re publica" (Da República) e "De Legibus" (Das Leis), devido a essas citações é que se podem recriar diversos de seus trabalhos usando os fragmentos que restam. Cícero também articulou um conceito abstrato de direitos, baseado em lei antiga e costume. Dos livros de Cícero, seis sobre retórica sobreviveram, assim como partes de oito livros sobre filosofia. Dos seus discursos, oitenta e oito foram registados, mas apenas cinquenta e oito sobreviveram.

Seu livro De Natura Deorum, que discute teologia, foi considerado, por Voltaire, possivelmente o melhor livro de toda a Antiguidade [22].

Carreira pública

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Marco Túlio Cícero

Questor

O seu primeiro cargo foi como um dos vinte questores anuais, um trabalho de treino para a administração pública em áreas diferentes, mas com ênfase tradicional na administração e a contabilidade rigorosa de dinheiro público sob a orientação de um magistrado veterano ou comandante provincial.
Cícero serviu como questor na Sicília Ocidental em 75 a.C. e demonstrou grande honestidade e integridade na forma como lidava com os habitantes. Como resultado, os gratos Sicilianos pediram a Cícero que processasse Caio Verres, um governador da Sicília, que tinha pilhado a ilha. A sua acusação de Caio Verres foi um grande sucesso forense para Cícero. Depois do fim deste caso, Cícero tomou o lugar de Hortênsio, advogado de Verres, como o maior orador de Roma. A oratória era considerada uma grande arte na Roma antiga, e uma ferramenta importante para espalhar conhecimento e promover-se a si próprio em eleições, em parte porque não havia meios de comunicação regulares na altura. Apesar dos seus grandes sucessos como advogado, Cícero não tinha uma genealogia com reputação: não era nem nobre nem patrício.[carece de fontes]

Cícero cresceu num tempo de confusão civil e guerra. A vitória de Sula na primeira de muitas guerras civis deu lugar a uma infra-estructura constitucional que sabotava a liberdade, o valor fundamental da República Romana. De qualquer modo, as reformas de Sula fortaleceram a posição dos equestres, contribuindo para o aumento do poder político dessa classe. Cícero era um eques Italiano e um novus homo, mas acima de tudo, era um constitucionalista romano. A sua classe social e lealdade à República certificaram-se que ele iria "comandar o suporto e confiança do povo assim como as classes médias Italianas." O facto dos optimates nunca o terem aceitado realmente, prejudicou os seus esforços para reformar a República ao mesmo tempo que preservava a constituição. Mesmo assim, ele foi capaz de subir o cursus honorum, ocupando cada posto exactamente na idade mais jovem possível, ou perto dela: Questor em 75 a.C. (31 anos), Edil em 69 a.C. (37 anos), ePretor em 66 a.C. (40 anos), onde serviu como presidente do Tribunal de "Reclamação" (ou extorsão). Foi depois eleito Cônsul quando tinha 43 anos.

Cícero e Pompeu

Cônsul

Cícero foi eleito Cônsul em 63 a.C. O seu co-cônsul nesse ano, Caio António Híbrida, teve um papel menor. Nesse cargo, ele destruiu uma conspiração para derrubar a República, liderada por Lúcio Sérgio Catilina. O Senado deu a Cícero o direito de usar o Senatus Consultum de Re Publica Defendenda (uma declaração de lei marcial), e ele fez Catilina deixar a cidade com quatro discursos (as famosas Catilinárias), que até hoje são exemplos estupendos do seu estilo retórico. As Catilinárias enumeraram os excessos de Catilina e os seus seguidores, e denunciaram os simpatizantes senatoriais dele como sendo patifes e devedores dissolutos, que viam Catilina como uma esperança final e desesperada. Cícero exigiu que Catilina e os seus seguidores deixassem a cidade. Quando acabou o seu primeiro discurso, Catilina saiu do Templo de Júpiter Stator. Nos seus próximos discursos, Cícero não se dirigiu directamente a Catilina, mas ao Senado. Com estes discursos, Cícero queria preparar o Senado para o pior caso possível, e também entregou mais provas contra Catilina.[carece de fontes]

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Cícero denuncia Catilina, fresco por Cesare Maccari, 1882-1888.

Catilina fugiu e deixou para trás outros conspiradores para começarem a revolução de dentro, enquanto Catilina iria atacar a cidade com um exército de "falidos morais e fanáticos honestos". Catilina tinha tentado ter ajuda dos Alobroges, uma tribo da Gália Transalpina, mas Cícero, trabalhando com os Gauleses, conseguiu recuperar cartas que incriminavam cinco conspiradores e os forçaram a confessar os seus crimes em frente ao Senado.[23]

O Senado então decidiu qual seria o castigo dos conspiradores. Como era o corpo conselheiro dominante das várias assembleias legislativas e não um corpo judicial, o seu poder tinha limites. Contudo, o país estava a funcionar em lei marcial, e temia-se que as opções normais (prisão domiciliária ou exílio), não eram o suficiente para remover a ameaça contra o estado. A princípio, a maioria dos Senadores queriam usar a "pena extrema", mas muitos foram desencorajados por Júlio César, que criticou o precedente que iria ser criado, e falou a favor de prisão perpétua em vária cidades italianas.Catão então defendeu a pena de morte e todo o Senado concordou. Cícero ordenou que os conspiradores fossem levados a Tullianum, onde foram estrangulados. O próprio Cícero acompanhou o ex-cônsul Públio Cornélio Lêntulo Sura, um dos conspiradores, a Tullianum. Cícero recebeu o honorífico "Pater Patriae" por ter suprimido a conspiração, mas desde então viveu com medo de ser julgado ou exilado por ter condenado cidadãos Romanos à morte sem julgamento.

Exílio e retorno

Em 60 a.C., Júlio César convidou Cícero para ser o quarto membro do grupo que era formado por ele, Pompeu e Crasso, o que mais tarde seria chamado o Primeiro Triunvirato. Cícero recusou porque suspeitava que isto prejudicasse a República.[24]

Em 58 a.C., Públio Clódio Pulcro, o tribuno dos plebeus, introduziu uma lei (a Leges Clodiae) com a ameaça do exílio a quem quer que tivesse executado um cidadão Romano sem julgamento. Cícero, tendo executado membros da conspiração de Catilina quatro anos antes sem um julgamento formal, e tendo atraído a ira de Clódio ao arruinar o seu alibí num caso, era o alvo da nova lei. Cícero disse que o senatus consultum ultimum o protegia de castigo, e tentou ganhar o suporto de senadores e cônsules, especialmente de Pompeu. Quando a ajuda não se materializou, ele foi exilado. Chegou à Tessalónica, na Grécia, no dia 23 de Maio de 58 a.C.[25][26][27] O exílio fê-lo cair em depressão, como é possível ver numa carta em que diz a Ático que foram os pedidos deste último que o impediram de se suicidar.[28] Depois novo Tribuno Tito Ânio Papiano Milão ter intervindo, o Senado, com a excepção de Clódio, foi unânime no seu voto a favor de chamar Cícero de volta. Cícero voltou para a Itália no dia 5 de Agosto de 57 a.C., em Brundisium.[29] Foi acolhido por uma multidão e pela sua querida filha Túlia.[30]

Cícero tentou reintegrar-se na política, mas falhou no seu ataque de uma lei de César. A conferência em Luca, em 56 a.C., forçou Cícero a mudar a sua posição e a dar o seu suporto ao Triunvirato. Com isto, Cícero voltou aos seus trabalhos literários e abandonou a política durante os próximos anos.[31]

A Guerra Civil de Júlio César

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Caio Júlio César.

A luta entre Pompeu e Júlio César ficou mais intensa em 50 a.C.. Cícero escolheu o lado de Pompeu, mas ao mesmo tempo também evitou alienar César abertamente. Quando César invadiu a Itália em 49 a.C., Cícero fugiu de Roma. César, querendo a legitimacia que o patrocinamento de um senador e veterano lhe daria, tentou atrair o favor de Cícero, mes este saiu de It’alia e viajou para (Dyrrachium), na Ilíria, onde o pessoal de Pompeu estava.[32] Cícero depois viajou com as forças de Pompeu até Farsália em 48 a.C.,[33] apesar de estar a perder a fé na competência e intenções do grupo de Pompeu. Eventualmente, ele provocou a hostilidade de Catão, que lhe disse que ele teria sido mais útil aos optimates se tivesse ficado em Roma. Depois da vitória de César, Cícero voltou a Roma, mas com cuidado. César perdoou-o e Cícero tentou ajustar-se à situação e manter o seu trabalho político, esperando que César ressuscitasse a República e as suas instituições.

Numa carta a Varro em c. 20 de Abril de 46 a.C., Cícero criou a sua estratégia sob a ditadura de César. Contudo, ele foi completamente surpreendido pela acção dos Liberatores, que assassinaram César nos Idos de Março em 44 a.C.. Cícero não tinha sido incluído na conspiração, apesar dos conspiradores terem a certeza de que ele simpatizava com eles. Marco Júnio Bruto chamou o nome de Cícero e pediu-lhe que restaurasse a República quando levantou o punhal ensaguentado depois do assassinato.[34] Numa carta escrita em Fevereiro de 43 a.C. aTrebónio, um dos conspiradores, Cícero disse que desejava ter sido convidado para "aquele glorioso banquete nos Idos de Março"![35] Cícero tornou-se num líder popular durante o período de instabilidade depois do assassínio. Ele não tinha nenhum respeito por Marco António, que queria vingar-se dos assassinos de César. Em troca da amnistía dos assassinos, Cícero fez com que o Senado concordasse em não considerar César um tirano, o que permitiu aos Cesarianos terem suporto legal.

Oposição a Marco António, e morte

Cícero e Marco António transforaram-se nos dois homens mais importantes de Roma: Cícero era o porta-voz do Senado, e Marco António o cônsul, líder da facção Cesariana, e executor oficial do testamento de César. Os dois homens nunca tinham estado em termos amigáveis e a relação deles piorou com a opinião de Cícero que Marco António estava a tomar liberdades com a sua interpretação dos desejos e intenções de César. Quando Octaviano, o herdeiro e filho adoptivo de César, chegou a Itália em Abril, cícero formou um plano para o usar contra Marco António. Em Setembro, Cícero começou a atacar Marco António numa série de discursos chamadas Filípicas, em honra das denunciações Demóstenes contra Filipe II da Macedónia. Elogiando Octaviano, ele disse que o jovem apenas queria honra e não iria fazer o mesmo erro que o seu pai adoptivo. Durante este tempo, a popularidade de Cícero não tinha par.[36]

Cícero apoiou Décimo Júnio Bruto Albino como governador da Gália Cisalpina e disse ao Senado para declarar Marco António como um inimigo do estado. O discurso de Lúcio Pisão, o sogro de César, atrasou isto, mas Marco António foi considerado um inimigo do estado quando se recusou a acabar o cerco de Mutina, que estava nas mãos de Décimo Bruto. O plano de Cícero, contudo, falhou. Marco António e Octaviano reconciliaram-se e tornaram-se aliados, juntamente com Lépido, formando assim o Segundo Triunvirato depois das batalhas sucessivas de Forum Gallorum e Mutina. O Triunvirato começou a usar proscrições para se livrarem dos seus inimigos e rivais potenciais imediatamente depois de legislarem a aliança e a legalizarem por um termo de cinco anos com imperium consular. Cícero e todos os seus contactos e apoiantes estavam entre aqueles considerados inimigos do estado e, segundo Plutarco, Octaviano discutiu durante dois dias contra colocar Cícero na lista.[37]

Cícero foi procurado viciosamente. Era visto com simpatia por grande parte do público e muitas pessoas recusaram-se a reportá-lo. Foi apanhado no dia 7 de Dezembro de 43 a.C. ao deixar a sua villa em Fórmias numa liteira para ir para a costa, onde ele esperava embarcar num barco a caminho da Macedónia.[38] Quando os assassinos, Herénio (um centurião) e Popílio (um tribuno), chegaram, os escravos de Cícero disseram que não o tinham visto, mas reportado por Filólogo, um liberto do seu irmão Quinto Cícero.[38]

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Cícero com cerca de 60 anos, busto de mármore.

Depois de ser descoberto, diz-se que as últimas palavras de Cícero foram: "Não há nada correcto no que estás a fazer, soldado, mas tenta matar-me correctamente." Fez uma vénia aos seus captores, inclinando a cabeça para fora da liteira num gesto gladiatorial para facilitar a tarefa. Ao mostrar o seu pescoço e garganta aos soldados, estava a indicar que não iria resistir. Segundo Plutarco, Herénio matou-o primeiro, e depois cortou-lhe a cabeça. Seguindo ordens de Marco António, as suas mãos, que tinham escrito as Filípicas, também foram cortadas e pregadas, juntamente com a sua cabeça, na Rostra no Fórum Romano de acordo com a tradição de Mário e Sula, que tinham feito o mesmo às cabeças dos seus inimigos. Cícero foi a única vítima das proscrições a ter este tratamento. Segundo Dião Cássio[39] (numa história por vezes atribuída a Plutarco por engano), a esposa de Marco António, Fúlvia, pegou na cabeça de Cícero, arrancou-lhe a língua, e trespassou-a com o seu gancho de cabelo numa vingança final contra o seu poder de discursar.[40]

O filho de Cícero, Marco, vingou a morte do seu pai quando foi cônsul em 30 a.C., ao anunciar a derrota naval de Marco António em Actiumem 31 a.C. contra Octaviano e Agripa. Na mesma reunião, o Senado votou para proibir os futuros descendentes Antonius de usarem o nomeMarco. Octaviano iria mais tarde encontrar um dos seus netos a ler um livro escrito por Cícero. O rapaz tentou esconder o livro, com medo da reacção do avô. Octaviano, agora Augusto, tirou-lhe o livro, leu parte, e devolveu-lho, dizendo: "Ele era um homem sábio, cara criança, um homem sábio que amava a sua pátria."[41]

Legado

Cícero era um escritor talentoso e energético, com um intereste numa grande variedade de tópicos de acordo as tradições filosóficas e helenísticas nas quais ele tinha sido treinado. A qualidade e acessibilidade de textos dele favoreceram grande distribuição e inclusão nos currículos escolares. Os seus trabalhos estão entre os mais influenciais na cultura Europeia, e ainda hoje constituem um dos corpos mais importantes de material primário para a escrita e revisão da história romana.

Depois da guerra civil, Cícero sabia que o fim da República esta perto. A guerra tinha destruído a República e a vitória de César tinha sido absoluta. O assassinato de César não restituiu a República, apesar de mais ataques à liberdade pelo "próprio capanga de César, Marco António." A sua morte apenas sublinhou a estabilidade do governo de um único homem, visto que foi seguida pelo caos e mais guerras civis entre os assassinos de César, Bruto e Cássio, e finalmente entre os seus apoiantes, Marco António e Octaviano.

Referências

1. ↑ Cornelius Nepos, Atticus 16, trans. John Selby Watson.

2. ↑ Haskell, H.J.:"This was Cicero" (1964) p.296

3. ↑ Castren and Pietilä-Castren: "Antiikin käsikirja" /"Handbook of antiquity" (2000) p.237

4. ↑ Rawson, E.:"Cicero, a portrait" (1975) p.8

5. ↑ Everitt, A.:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) p.35

6. ↑ Rawson, E.: Cicero, a portrait (1975) p.5-6; Cicero, Ad Familiares 16.26.2(Quintus to Cicero)

7. ↑ Plutarco, Cicero 1.3–5

8. ↑ Plutarco, Cicero 2.2

9. ↑ Plutarco, Cicero 3.2

10. ↑ Rawson, E.: "Cicero, a portrait" (1975) p.22

11. ↑ Haskell, H.J.: "This was Cicero" (1940) p.83

12. ↑ Rawson:"Cicero, a portrait" (1975) p.18

13. ↑ Rawson, E.: "Cicero, a portrait" (1975) p.25

14. ↑ Rawson, E.: Cicero p.225

15. ↑ Haskell H.J.: This was Cicero, p.95

16. ↑ Haskell, H.J.:"This was Cicero" (1964) p.249

17. ↑ Cicero, Cartas a Ático, 12.14. Rawson, E.: Cicero p. 225

18. ↑ Rawson, E.:Cicero p.226

19. ↑ Cicero, Samtliga brev/Collected letters

20. ↑ Haskell, H.J.: This was Cicero (1964) p.103- 104

21. ↑ Paavo Castren & L. Pietilä-Castren: Antiikin käsikirja/Encyclopedia of the Ancient World

22. ↑ Peter Gay, The Enlightenment - The Rise of Modern Paganism, W.W. Norton & Company, 1995, p. 109

23. ↑ Cicero, In Catilinam 3.2; Sallust, Bellum Catilinae 40-45; Plutarco, Cicero 18.4

24. ↑ Rawson, E.: Cicero, 1984 106

25. ↑ Haskell, H.J.: This was Cicero, 1964 200

26. ↑ Haskell, H.J.: This was Cicero, 1964 p.201

27. ↑ Plutarco, Cicero 32

28. ↑ Haskell, H.J.: "This was Cicero" (1964) p.201

29. ↑ Cicero, Samtliga brev/Collected letters (in a Swedish translation)

30. ↑ Haskell. H.J.: This was Cicero, p.204

31. ↑ Grant, M: "Cicero: Selected Works", p67

32. ↑ Everitt, Anthony: Cicero pp. 215.

33. ↑ Plutarco, Cicero 38.1

34. ↑ Cicero, Second Philippic Against Antony

35. ↑ Cicero, Ad Familiares 10.28

36. ↑ Appian, Civil Wars 4.19

37. ↑ Plutarco, Cicero 46.3–5

38. ↑ a b Haskell, H.J.: This was Cicero (1964) p.293

39. ↑ Dião Cássio, Roman History 47.8.4

40. ↑ Everitt, A.: Cicero, A turbulent life (2001)

41. ↑ Plutarco, Cicero, 49.5

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