As pessoas vivem em grupos. Essa constatação não representa a realidade total da evolução do ser humano nem da sociedade humana; também não esgota as características do ser humano, hoje visto e entendido como ser de relações. Outras questões precisam ser respondidas: as pessoas sempre viveram e sempre quiseram viver em grupo? O que moveu os indivíduos a se agruparem?
Parece que não é errado dizer que nem sempre os seres humanos viveram em grupo, formando o que chamamos de sociedade. Também não erramos quando afirmamos que o ser humano está, constantemente, insatisfeito. E se está insatisfeito é porque possui necessidades. Essa parece ser a principal e, talvez, primeira explicação para a organização das sociedades humanas. A satisfação das necessidades.
Sendo assim podemos dizer que as pessoas gostam de estar sozinhas, mas vivem em grupos. Gostam de estar sozinhas porque a solidão permite liberdades que não é possível no grupo. Mas necessitam do grupo porque nem tudo de que precisam conseguem isoladamente. A associação ocorre, portanto, não porque o ser humano é, essencialmente, gregário, mas é segregacionista, é sectério, e se agrupa por necessidade de sobrevivência. O grupo, portanto, nasce dos interesses pessoais e das necessidades dos indivíduos.
O que é, então, o ser humano?
Sabemos, inicialmente, que o ser humano é um animal que ganhou a classificação de racional. Aristóteles lhe afirmou mais uma característica: é político, de onde a característica da sociabilidade. Racional porque consegue abstrair e aprender com as experiências. E, mais do que aprender, consegue reproduzir e ampliar as aplicações das experiências adquiridas. Isso porque aprendeu a raciocinar. É, além disso, político porque vive, sobrevive e explora as relações sociais. Embora, como dissemos antes, goste do isolamento, prefere viver em grupo. O grupo, portanto, não é essencial, mas opção: para satisfazer suas necessidades, para satisfazer seus desejos, para superar seus medos, para superar suas fraquezas.
Nisso podem ser observadas mais algumas das características desse ser, chamado homem. Diferentemente dos demais animais, o humano é frágil, desprovido de garras ou pele resistente aos ataques dos predadores e intempéries. Essa fragilidade produziu e ajudou no desenvolvimento de outra característica: o medo. Como mecanismo de superação dos medos os humanos desenvolvem mecanismos para conviver ou para superar adversidades da natureza. Um desses mecanismos é a vida grupal. Os humanos, portanto vivem em grupo, entre outros motivos, porque assim se protegem mutuamente. Tanto para enfrentar a natureza como para atingir objetivos comuns. O grupo passa ser um mecanismo de defesa. Os humanos aproveitam-se de suas fraquezas para produzir forças. A força do grupo nasce de uma característica muito marcante do ser humano: a capacidade de tirar benefício dos demais membros do grupo, o que indica outra característica do humano: o egocentrismo, sendo que o grupo aparece como refúgio, fortaleza e espaço de onde o indivíduo tira proveito e benefícios. As relações grupais não estão para o grupo, mas para os indivíduos do grupo. Trata-se, portanto, de uma relação interesseira.
Dessa forma é que devemos entender a característica humana da sociabilidade. A sociabilidade, ou a capacidade de o ser humano viver, sobreviver e existir em coletividade parece ser o que mais bem o caracteriza. Entretanto aqui precisamos fazer uma ressalva. Não nos parece que os humanos sejam, essencialmente, seres sociais, mas se fazem sociais a partir de suas necessidades e para superar seus medos.
Dizendo de outra forma, o ser humano é um ser sectário e tende a se isolar e a viver isolado. Socializa-se porque se percebe impotente diante da natureza, mais forte que ele. E, por ter medo de não sobreviver procura ajuda dos seus semelhantes. Assim se faz sociável numa atitude tipicamente egocêntrica, medrosa e aproveitadora. Para fugir de seus medos e disfarçar sua fraqueza aproveita-se da fraqueza dos seus semelhantes. Assim sendo os indivíduos usam a sociedade como caminho, preparação, para o isolamento, depois de se aproveitar das fraquezas dos outros seres, como ele, fracos e medrosos.
Além disso, o ser humano se percebe no mundo e se vê completamente diferente das demais realidades existentes. Em todas as correntes de filosofia encontramos a mesma afirmação: o ser humano é pensante. É ele quem dá sentido a existência dos existentes. Dá sentido porque pensa, porque se socializa e porque manipula os elementos da realidade, gerando cultura. Além disso, e sem entrar no mérito da discussão religiosa, pode-se dizer que o ser humano transcende à realidade humana.
Pensar não é só o que se pode entender etimologicamente, com a palavra, dizendo que ser humano é capaz de pesar, avaliar. Esse pensar refere-se também à capacidade humana de fazer escolhas. O ser humano é aquele que avalia, escolhe, e faz isso a partir de um processo reflexivo que exige uma postura introspectiva. Esta por sua vez deriva da capacidade de abstração. Na verdade quando se diz que o ser humano é capaz de pensar pretende-se afirmar que ele é capaz de falar sobre as realidades com as quais não está em contato imediato. Ele pode representá-las, mentalmente e nisso se dá um processo de reflexão, pois se trata de “voltar a ver” o que não está presente.
Essas características (pensamento, abstração, manipulação...) permitem, que o ser humano produza o que chamamos de progresso humano (outro nome da cultura). O progresso é resultante da vida social, da superação dos medos e dos desafios. O progresso humano pode ser visto como resultado da capacidade humana de resolver problemas (capacidade reflexiva-pensante) e de se associar a outros humanos para fortalecer suas fraquezas diante das realidades mais fortes e que demandam inteligência (ler o interior das realidades) e ação conjunta. Progredir implica em superar as limitações humanas e naturais em benefício do grupo e, conseqüentemente, em benefício dos indivíduos. O progresso ganha sentido, como toda ação humana, não em si mesmo, mas pelo benefício que produz.
Daí o sentido da produção humana. O ser humano manipula o mundo e gera cultura. Ou seja, diferentemente de outras criaturas, a humana se autoproduz reproduzindo o meio que o circunda. Recria o mundo natural que o circunda e recria o já criado, dando-lhe novo significado. Sua insatisfação o leva a re-significar as realidades mesmo as que já possuem significado; recria a utilização e a utilidade das realidades mesmo as que já têm significado e utilidade consagrada.
Graças a essa capacidade re-criadora o ser humano pode produzir o mundo e reproduzir o que existe. Com isso dinamiza não só sua existência como as realidades que o circundam e seus concidadãos. Nesse processo cria ou re-cria a cultura uma das marcas mais tipicamente humanas, pois, principalmente por essa capacidade de recriar a cultura, o ser humano se diferencia dos demais existentes.
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[1] Mestre em Educação (UFMS). Especialista em Educação. Especialista em Leitura Popular da Bíblia. Professor de História e de Filosofia na rede estadual, em Rolim de Moura – RO. Filósofo; Teólogo; Historiador. Professor de Filosofia e Ética na Faculdade de Pimenta Bueno; radialista colaborador em jornais da região.
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