Em geral, qualquer noção que sirva como regra para a investigação ou para a sua expressão lingüística em qualquer campo. Historicamente, o primeiro significado atribuído às C. é realista: elas são consideradas determinações da realidade e, em segundo lugar, noções que servem para indagar e para compreender a própria realidade. Foi essa a concepção de Platão, que as chamou de "gêneros supremos" e enumerou cinco desses gêneros, a saber: o ser, o movimento, o repouso, a identidade e a alteridade (5o/, 254 ss.). Assim como alguns desses gêneros estão interligados e outros não, também as partes do discurso, isto é, as palavras, se interligam, e quando essa mescla corresponde à real, o discurso é verdadeiro; caso contrário é falso {Ibid., 263 ss.). Essa correspondência entre a realidade e o discurso, através das determinações categoriais, é também a base da teoria da Aristóteles. Este, porém, parte de um ponto de vista lingüístico: as C. são os modos em que o ser se predica das coisas nas proposições, portanto os predicados fundamentais das coisas. Enumera dez categorias, exemplificando como segue: 1° Substância, p. ex.: homem ou cavalo; 2° Quantidade, p. ex.: dois côvados; 3° Qualidade, p. ex.: branco; 4° Relação, p. ex.: maior; 5° Lugar, p. ex.: no liceu; 6° Tempo, p. ex.: ontem; 7° Posição, p. ex.: está sentado; 8° Ter, p. ex.: usa sapatos; 9° Agir, p. ex.: cortar; 10° 5bfrer, p. ex.: ser cortado (.Top., I, 9, 103 b 20 ss.; Cat., 1 b 25 ss.). A relação entre as C. e o ser é assim explicada: "Porquanto a predicação afirma às vezes o que uma coisa é, às vezes a sua qualidade, às vezes a sua quantidade, às vezes a sua relação, às vezes aquilo que faz ou o que sofre e às vezes o lugar onde está ou o tempo, segue-se que tudo isso são modos do ser" (Mel, V, 7, 1017 a 23 ss.). Esse conceito de C. como determinação pertencente ao próprio ser e do qual o pensamento deve servir-se para conhecê-lo e exprimi-lo em palavras durou muito tempo; e por muito tempo as escolas filosóficas ou os filósofos só discordaram quanto ao número ou a distinção das categorias. Assim, os estóicos reduziram-nas a quatro: substância, qualidade, modo de ser e relação (SIMPLÍCIO, In Cat., f. 16 d). Plotino retornou aos cinco gêneros supremos de Platão (Enn., VI, 1, 25). Na Idade Média, a única alternativa à doutrina do fundamento real das C. é o seu caráter puramente verbal, defendido pelo nominalismo. Ockham afirma claramente que as C. não passam de signos das coisas, signos simples com os quais podem ser constituídos "complexos" verdadeiros ou falsos (De corpore Christi, 15; In Sent., I, d. 30, q. 2, I). Portanto, a distinção das C. não implica uma distinção paralela entre os objetos reais, já que nem sempre a conceitos ou a palavras distintas correspondem coisas distintas. As C. de substância, qualidade e quantidade, embora distintas como conceitos, significam a mesma coisa (QuodL, V, q. 23). Essa negação radical da realidade das C. deriva da negação total que o nominalismo medieval fazia de qualquer realidade universal. Esse ponto de vista eqüivale a considerar as C. como simples nomes que se referem a classes de objetos. A doutrina de Kant nada tem a ver com esse nominalismo, embora também negue o realismo da concepção clássica. Para Kant as C. são os modos pelos quais se manifesta a atividade do intelecto, que consiste, essencialmente, "em ordenar diversas representações sob uma representação comum", isto é, em julgar. Elas são, portanto, as formas do juízo, isto é, as formas em que o juízo se explica, independentemente do seu conteúdo empírico. Por isso, as C. podem ser extraídas das classes do juízo, enumeradas pela lógica formal. "Desse modo", diz Kant, "surgem tantos conceitos puros do intelecto, que se aplicam a priori ao objetos da intuição em geral, quantas eram as funções lógicas em todos os juízos possíveis no quadro precedente (isto é, na classificação dos juízos); porque as chamadas funções esgotam completamente o inelecto e põem à prova o seu poder" (Crít. R. Pura, Anal. dos conceitos, § 10). As C. são os conceitos primitivos do intelecto puro e condicionam todo o conhecimento intelectual e a própria experiência; mas elas não se aplicam às coisas em si, e o conhecimento que delas se vale (isto é, todo o conhecimento humano) não pode estender-se, portanto, a tais "coisas em si" ou "númenos". As categorias são, todavia, condições da validade objetiva do conhecimento, isto é, do juízo em que o conhecimento se concretiza. Com efeito, um juízo é uma conexão entre representações, mas tal conexão não é subjetiva, logo não vale só para o sujeito isolado que a efetua, mas é feita em conformidade com uma categoria, isto é, segundo um modo, uma regra que é igual para todos os sujeitos e que, portanto, confere necessidade e objetividade àquilo a que se ligou na percepção (Prol., § 22). A doutrina de Kant sobre as C. pode, por isso, ser reduzida a dois pontos fundamentais: 1° as C. dizem respeito à relação sujeito-objeto e, por isso, nào se aplicam a uma eventual "coisa em si" que esteja fora dessa relação; 2° as C. constituem as determinações dessa relação e são, portanto, válidas para qualquer ser pensante finito. Kant enumerava doze C, correspondentes às doze classes de juízos: 1° C. de quantidade, unidade, multiplicidade, totalidade; 2° C. de qualidade, realidade, negação, limitação; 3° C. de relação-, inerência e subsistência (substância e acidente), causalidade e dependência (causa e efeito), comunhão (ação recíproca); 4° C. de modalidade, possibilidade-impossibilidade, existência- inexistência, necessidade-contingência. O conceito kantiano das C. continuou prevalecendo na filosofia moderna e contemporânea, se bem que mesmo os filósofos mais estritamente kantianos não tenham entrado num acordo sobre o "quadro" das categorias. Em geral, os neocriticistas procuraram simplificar e unificar esse quadro; Renouvier, p. ex., considerou fundamental a C. relação (já que a consciência é relação) e considerou as outras (número, extensão, duração, qualidade, devir, força, finalidade, personalidade) como determinações e especificações dela (Essai de critique générale, I, 1854, pp. 86 ss.). E Cohen considerou como C. fundamental a do sistema, porque a unidade do objeto, em que se funda a unidade da natureza, é uma unidade sistemática (Logik, p. 339). Mas, embora não tenha havido filósofo de inspiração kantiana que não tenha desejado criar seu quadro de C, o conceito kantiano permaneceu inalterado para toda a parcela da filosofia moderna que se inspira em Kant. Todavia, esse conceito não é o único na filosofia moderna e contemporânea. O conceito tradicional de C. como "determinação do ser" foi retomado pelo idealismo romântico e, em especial, por Hegel. Este considera as C. como "determinações do pensamento" e atribui a Fichte o mérito de haver afirmado a exigência da sua "dedução", isto é, da demonstração da sua necessidade {Ene, § 43). Mas na verdade, para Hegel, as determinações do pensamento são, simultaneamente, as determinações da realidade (pela identidade, por ele formulada, entre realidade e razão) e, habitualmente, chama essas determinações de "momentos", e não de C. A única C. que ele reconhece verdadeiramente como tal é a própria realidade-pensamento, isto é, a autoconsciência, o eu ou a razão. Em Fenomenologia (I, cap. V, § 2), diz: "O eu é a única essencialidade pura do ente ou a C. simples. A C, que de outro modo tinha o significado de ser a essencialidade do ente, essencialidade indeterminada do ente em geral ou do ente contra a consciência, agora é essencialidade ou simples unidade do ente, considerado apenas como realidade pensante: ou seja, a C. consiste no fato de autoconsciência e ser serem a mesma coisa". Quer dizer: a C. não deve ser considerada como uma determinação do ser em geral, mas como a consciência e, portanto, a própria realidade. Essa teoria do eu e da consciência ou do espírito como única C. permaneceu lugar-comum de todas as formas de idealismo romântico. Simetricamente oposta à de Hegel é a doutrina de Heidegger, para quem a C. não é a determinação da autoconsciência ou ao eu, mas do ser das coisas. Heidegger faz a distinção entre os existenciais (Existentialen), que são as determinações do ser e da realidade humana, do seraí (Dasein), e as outras C, que são "determinações do ser dos entes não conformes ao ser-aí": isto é, determinações do ser das coisas (Sein undZeit, § 9). Na filosofia contemporânea, encontra-se tanto a retomada da concepção clássica e da concepção kantiana da C, quanto novas generalizações sobre seu significado: le A concepção clássica da C. como "determinação do ser" é retomada por N. Hartmann, que considera as C. como as estruturas necessárias do ser em si. Tais estruturas produzem a estratificaçào do mundo numa série de planos. Existem as C. fundamentais, que pertencem a todos os planos do ser, e que são as C. modais; há as C. bipolares (qualidade-quantidade; contínuo-descontínuo; forma-matéria, etc.) e, em terceiro lugar, as C. do real, que determinam os caracteres da realidade efetiva e que se dividem em quatro grupos, correspondentes ao princípio do valor, ao princípio da crença, ao princípio da planificação e ao princípio da dependência (Aufbau der realen Welt, 1940). 2° A concepção kantiana de C. como condição do objeto e o encaminhamento para a concepção instrumental da C. unem-se na doutrina de Husserl. Para ele, a noção de C. vincula-se à de região antológica e designa o conceito que serve para definir uma região em geral ou o que entra na definição de uma região particular (p. ex., "a natureza física"). Os conceitos que entram na definição de uma região em geral — e por isso são empregados nos axiomas lógicos — são chamados por Husserl de "C. lógicas", ou "C. da região". São os conceitos de propriedade, qualidade, relação de coisas, relação, conjunto, número, etc. Têm afinidade com essas categorias as chamadas "C. do significado", inerentes à essência da proposição. C. lógicas e C. do significado são analíticas. Já os conceitos que entram na constituição dos axiomas regionais são chamados por Husserl de C. sintéticas. "Os conceitos fundamentais sintéticos ou C", diz Husserl, "são os conceitos regionais fundamentais (referem-se por essência a uma região determinada e aos seus princípios sintéticos), de tal modo que há tantos grupos distintos de C. quantas são as regiões" (Ideen, I, § 16). Para Husserl, as C. têm sempre caráter objetivo, já que as regiões ontológicas, cujos axiomas servem para exprimir, são as formas da objetividade: ou da objetividade em geral ou de uma objetividade específica. Também existem, portanto, "C. do substrato" (Ibid., § 14), que se diferenciam das precedentes C. "sintáticas" (isto é, derivadas) porque se referem a substratos inderiváveis, isto é, de natureza concreta e individual: a essência material e o "este aqui", que, no fundo, é o indivíduo (Ibid., § 16). Nessa concepção husserliana de C, prevalecem os traços realistas, embora o objeto ou as regiões ontológicas de que Husserl fala ainda sejam objetos da intencionalidade da consciência. 3° Em algumas outras correntes da filosofia contemporânea, como p. ex. no empirismo lógico, as C. são consideradas regras convencionais que regem o uso dos conceitos. Assim, p. ex., Ryle chama de "tipo ou categoria lógica de um conceito o conjunto de modos nos quais, por convenção, é lícito utilizar o termo respectivo" (Concept ofMind, Intr., trad. it., p. 4). Essa é, certamente, a noção menos dogmática e mais geral de C. que a filosofia propôs até hoje, mas ainda contém certo dogmatismo, pois limita as C. às já estabelecidas pelo uso lingüístico comum, negando implicitamente a validade de qualquer nova proposta. Contudo, cientistas, filósofos e pesquisadores em geral sempre exerceram o direito de propor novas C, isto é, novos instrumentos conceituais de investigação e de expressão lingüística. Donde a necessidade de formular a noção de categoria exatamente como a de tal instrumento: noção que, além de tudo, tem a vantagem de caracterizar igualmente bem a função efetiva de todos os conceitos de C. historicamente propostos. |
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