Esse termo tem dois significados fundamentais: 1° o sentido próprio e restrito, extraído do uso matemático (equivalente a proporção) de igualdade de relações; 2° o sentido de extensão provável do conhecimento mediante o uso de semelhanças genéricas que se podem aduzir entre situações diversas. No primeiro significado, o termo foi empregado por Platão e por Aristóteles e é até hoje empregado pela lógica e pela ciência. No segundo significado, o termo foi e é empregado na filosofia moderna e contemporânea. O uso medieval do termo é intermediário, entre um e outro significado. 1° Platão usou esse termo para indicar a igualdade das relações entre as quatro formas — duas a duas — de conhecimento, que distinguiu na República (VII, 14, 534 a 6), ou seja, entre a ciência e a dianóia, que pertencem à esfera da inteligência (que tem por objeto o ser), e entre a crença e a conjectura, que pertencem à esfera da opinião (que tem por objeto o vir-a-ser). "O ser está para o vir-a-ser", diz Platão, "assim como a inteligência para a opinião; e a inteligência está para a opinião assim como a ciência está para a crença e a dianóia para a conjectura". Aristóteles usa essa palavra no mesmo sentido de igualdade de relações. Assim, ele diz que as coisas em ato não são todas iguais entre si, mas são iguais por A., no sentido que todas têm a mesma relação com os termos que servem, respectivamente, de potências. "Não é necessário", diz Aristóteles, "pedir a definição de tudo, mas observar também a A., isto é, ver que o construir está para a habilidade de construir na mesma relação em que o estado de vigília está para o dormir, o ver para o ficar de olhos fechados, a elaboração do material para o próprio material e a coisa formada para a informe" (Met., 9, 6, 1.047 b 35 ss.). Do mesmo modo, Aristóteles afirma que os elementos e os princípios das coisas não são os mesmos, mas só análogos, no sentido de que são as mesmas as relações que têm entre si. P. ex., "no caso da cor, a forma será o branco; a privação, o negro; a matéria, a superfície; no caso da noite e do dia, a forma será a luz, a privação será a escuridão e a matéria será o ar" (ibid., 12, 4, 1.070 b 18). Obviamente, o branco, o negro e a superfície não são, respectivamente, o mesmo que luz, escuridão e ar, mas é idêntica a relação entre essas duas tríades de coisas (como entre muitíssimas outras tríades): relação que é expressa com os princípios de forma, privação e matéria. Nesse sentido, isto é, como igualdade de relações em todos os casos em que se acham realizados, tais princípios são chamados de analógicos. Fora da metafísica, a mais célebre aplicação do conceito de A. é a que, em ética, Aristóteles faz em relação à justiça distributiva. Esta consiste em dar a cada um segundo os seus méritos e, por isso, é constituída por uma proporção na qual as recompensas estão entre si assim como os méritos respectivos das pessoas a quem são atribuídos. Trata-se, nota Aristóteles, de uma proporção geométrica não contínua, já que nunca ocorre que a pessoa a quem se atribui alguma coisa e a coisa que se lhe atribui constituam um termo numericamente uno (Et. nic, V, 5, 1.131 a 3DAristóteles depois fez uso freqüente do conceito de analogia nos seus livros de história natural, dizendo que são análogos os órgãos "que têm a mesma função" (Depart. an., I, 5 645 b 6). Esse conceito deveria revelar-se de fundamental importância na biologia do séc. XIX. quando, com Cuvier, serviu de fundamento e de ponto de partida para a anatomia comparada. Nesse significado, sem alusão à noção de probabilidade, mas à de proporção, esse termo é hoje empregado em lógica. As "A. formais" são condicionadas pelo caráter transitivo das relações cuja igualdade estabelecem. P. ex., diz-se que, se "xê antepassado de y e yé antepassado de z, x c antepassado de z"; ou então: se "xê parte de y e y é parte de z, x é parte de z". A conclusão é exata, mas não o seria se, em lugar das relações "antepassado de" ou "parte de", fossem usadas, p. ex., "pai de", "ama" ou "odeia", etc. Não se pode dizer, com efeito, "x é pai de y e yé pai de z, logo x é pai de z". A A. vale só para as chamadas "relações transitivas", cujo princípio pode ser assim expresso: as asserções de que x está em relação transitiva com y e que y está em relação transitiva com z implicam a asserção de que x está em relação transitiva com z. O uso do termo no sentido de extensão provável do conhecimento foi iniciado pela Escolástica, embora tal significado tenha permanecido estranho à própria Escolástica. Com efeito, essa palavra teve uso metafísico-teológico para distinguir e, ao mesmo tempo, vincular o ser de Deus e o ser das criaturas, que tinham sido contrapostos pela Escolástica árabe e sobretudo por Avicena, respectivamente como o ser necessário, que não pode não ser, e o ser possível, que pode ser e por isso precisa do ser necessário para existir. Assim, Guilherme de Alvérnia diz que o ser das coisas criadas e o ser de Deus não são idênticos nem diferentes, mas análogos: de algum modo se assemelham e se correspondem, sem ter o mesmo significado (De Trin., 7). S. Tomás distingue, com mais precisão, o ser das criaturas, separável da sua essência e, portanto, criado, do ser de Deus, idêntico à essência e, portanto, necessário. Esses dois significados do ser não são unívocos, isto é, idênticos, nem equívocos, isto é, simplesmente diferentes; são análogos, ou seja, semelhantes, mas de proporções diversas. Só Deus tem o ser por essência; as criaturas o têm por particiação; elas, enquanto são, são semelhantes a Deus, que é o primeiro princípio universal do ser, mas Deus não é semelhante a elas: esta relação é a A. (S. Tb., I, q, 4, a. 3). A relação analógica estende-se a todos os predicados atribuídos, ao mesmo tempo, a Deus e às criaturas. P. ex., o termo "sábio", quando se refere ao homem, significa uma perfeição diferente da essência e da existência do homem, ao passo que, quando se refere a Deus, quer dizer uma perfeição idêntica à sua essência e ao seu ser; além disso, quando se refere ao homem, dá a entender o que quer significar, ao passo que, quando se refere a Deus, deixa fora de si a coisa significada, que transcende os limites do entendimento humano (ibid., I, q. 13, a. 5). O significado diferente que um termo pode assumir segundo a sua atribuição a esta ou àquela realidade foi depois chamado, pelos escolásticos, A. de atribuição. Esse tipo de A. verifica-se não só a propósito da atribuição de um mesmo termo a Deus e às criaturas, mas em muitos outros casos, como p. ex., quando se diz que um medicamento saudável e que um animal é saudável, na medida em que o medicamento é a causa da sanidade que está no animal (ibid., I, q. 13, a. 5). A A. de proporcionalidade refere-se, porém, só à analogicidade de significado entre o seráe Deus e o ser das criaturas, tornando-se tema de discussões polêmicas na Escolástica do séc. XIII e da primeira metade do séc. XIV. A A. de proporcionalidade é freqüentemente atribuída a Aristóteles pelos tomistas (assim como pelo próprio S. Tomás), mas na verdade, ainda que Aristóteles tivesse começado a reconhecer vários sentidos do ser, fizera-o só para reconduzilos a modos e especificações do único sentido de substância, isto é, do ser enquanto ser, do ser na sua necessidade, que é o objeto da metafísica. Aristóteles, por isso, não distinguia nem podia distinguir o ser de Deus do ser das outras coisas: p. ex., Deus e a mente são substâncias precisamente no mesmo sentido (Et. nic, I, 6, 1.096 a 24). O maior crítico e opositor do tomismo neste ponto foi Duns Scot, que, reportando- se exatamente a Aristóteles, considerou que a noção de ser é comum a todas as coisas existentes, logo tanto às criaturas quanto a Deus. Considerou-a, por isso, unívoca pelo motivo fundamental de que, se assim não fora, seria impossível conhecer algo de Deus e determinar qualquer atributo Seu, remontando, por via causai, das criaturas (Op. Ox., I, d. 3, q. 3, n. 9). Desse modo, também restabeleceu a unidade da ciência do ser, isto é, da metafísica — que, para o tomismo, dividia-se em ciência do ser criado (metafísica) e em ciência do ser necessário (teologia) — e, portanto, reduziu a teologia a ciência pratica (isto é, não dirigida para o conhecimento do homem, mas para a sua orientação com vistas à salvação. 2° O segundo significado desse termo, como extensão provável do conhecimento mediante a passagem de uma proposição que exprime certa situação para uma outra proposição que exprime uma situação genericamente semelhante, ou como extenso da validade de uma proposição de certa situação para uma situação genericamente semelhante, era conhecido pelos antigos com o nome de "procedimento por semelhança" . Aristóteles diz: "A probabilidade também aparece no procedimento por semelhança quando se diz o contrário do contrário: p. ex., se é preciso fazer o bem aos amigos, pode-se dizer, por semelhança, que é preciso fazer o mal aos inimigos" (Top., I, 10, 104 a 28; cf. El. sof, 173 b 38; 176 a 33, etc.) Esse procedimento, obviamente, nada tem que ver com a A.: a relação é diferente (assim como "fazer o mal" é diferente de "fazer o bem") e entre as duas situações, portanto, não há igualdade de relações, mas só uma semelhança genérica. Aristóteles aconselha a usar esse procedimento para questões polêmicas {Top., VIII, 1, 156 b 25). Euclides de Mégara já havia contestado sua validade lógica. Ele "repudiava o procedimento por semelhança dizendo que ele vale de coisas semelhantes ou de coisas dessemelhantes. Se de coisas semelhantes, é melhor tratar das próprias coisas do que das que lhes são semelhantes; se de coisas dessemelhantes, é inútil a comparação" (DlÓG. L., II, 107) Os epicuristas entendiam que a indução era um raciocínio por analogia e, portanto, defendiam a sua validade subordinadamente ao postulado da uniformidade da natureza. Diz Filodemo: "Quando nós julgamos: 'Já que os homens que estão ao nosso alcance são mortais, todos os homens são mortais', o método analógico só será válido se supusermos que os homems que não estão em condições de se mostrarem a nós são, sob todos os aspectos, semelhantes aos que estão ao nosso alcance, de tal modo que se deve pressupor que eles também são mortais. Sem esse pressuposto, o método da A. não é válido" (De signis, II, 25). Na filosofia moderna, a primeira defesa da A. é provavelmente a de Locke, que, no IV livro de Ensaio, inclui a A. entre os graus do assentimento; mais precisamente, considera- a como probabilidade concernente a coisas que transcendem a experiência. A A. é a única ajuda de que dispomos, segundo Locke, para alcançar um conhecimento provável dos "seres materiais finitos fora de nós", dos seres que, de qualquer modo, não nos sejam perceptíveis, ou enfim da maior parte das operações da natureza que se escondem da experiência humana direta (Ensaio, IV, 16). Leibniz concordou com Locke, ao ver na A. "a grande regra da probabilidade", na medida em que aquilo que não pode ser comprovado pela experiência pode parecer provável se está mais ou menos de acordo com a verdade estabelecida. Leibniz acrescenta alguns exemplos do uso que os cientistas fizeram da A. e recorda que Huygens, fundando-se precisamente nela, julgou que o estado dos outros planetas é muito semelhante ao da Terra, salvo pela diferença produzida por suas diferentes distâncias do Sol (Nouv. ess., IV, 16, 12). Na realidade, os cientistas dos sécs. XVII e XVIII utilizaram muito a A.; e não foi sem razão que Kant utilizou esse termo para exprimir alguns princípios regulativos fundamentais da ciência do seu tempo. Entendeu, em geral, por A. uma forma de prova teorética (v. PROVA) e definiu-a como "a identidade da relação entre princípios e conseqüências (entre causas e efeitos) enquanto tem lugar, não obstante, a diferença específica das coisas ou das qualidades em si (quer dizer: consideradas fora daquela relação), que contêm o princípio de conseqüências semelhantes" (Crít. do Juízo, § 90). Enumerou quatro "A. da experiência", enunciando-as do seguinte modo: d) princípio da permanência da substância, que assim se exprime: "Em toda mudança dos fenômenos a substância permanece e a sua quantidade na natureza não aumenta nem diminui"; b) princípio da série temporal segundo a lei da causalidade, que assim se exprime: "Todas as mudanças ocorrem segundo a lei do nexo de causa e efeito"; c) princípio da simultaneidade segundo a lei da ação recíproca, que assim se exprime: "Todas as substâncias, enquanto podem ser percebidas no espaço como simultâneas, estão entre si em ação recíproca universal". Kant esclareceu do seguinte modo o sentido em que esses princípios são chamados de analogias. Em matemática, as A. são fórmulas que exprimem a igualdade de duas relações quantitativas e são sempre constitutivas, isto é, quando são dados três membros da proporção, é dado também o quarto, que, portanto, pode ser construído. Em filosofia, porém, a A. é a igualdade entre duas relações não quantitativas, mas qualitativas: o que quer dizer que, dados três termos da proporção, o quarto termo não é, por isso, dado, mas só é dada certa relação com eles. Essa relação é uma regra para procurá-lo na experiência e um sinal para descobri-lo. De modo que o princípio da permanência da substância, o princípio de causalidade e o princípio de reciprocidade de ação não fazem parte verdadeiramente da constituição dos objetos de experiência, mas valem somente para descobri-los e para situá-los na ordem universal da natureza. Esses princípios são, é bem verdade, apriori, e portanto certos de forma indubitável, mas, ao mesmo tempo, são desprovidos de evidência intuitiva, ao passo que os "axiomas da intuição" (v. Axio- MA) e as "antecipações da percepção" (v. ANTECIPAÇÕES) são princípios constitutivos porque ensinam "como os fenômenos, tanto com respeito à sua realidade percebida, quanto com respeito à sua intuição, podem ser produzidos segundo as regras de uma síntese matemática" (Crít. R. Pura, Anal. dos princ, III, 3). Como se vê, permanece neste uso kantiano o significado da A. como igualdade entre relações, mas tais relações são ditas "qualitativas" no sentido de que, com elas, não são dados os objetos, mas só as relações que permitem descobri-los e organizá-los em unidades. E, com efeito, os princípios da permanência da substância, de causalidade e de reciprocidade não levam a conhecer nada, mas servem para descobrir os objetos cognoscíveis e organizá-los, segundo os seus nexos, na unidade da experiência. Nesse sentido, a A. é um instrumento, aliás, um dos instrumentos fundamentais para estender o conhecimento dos fenômenos naturais, usando como guia as suas conexões determinantes. A lógica e a metodologia da ciência do séc. XIX não confiaram na A., considerando-a, geralmente, como uma extensão da generalização indutiva além dos limites dentro dos quais ela oferece garantia de verdade. Stuart Mill considerou o raciocínio por A. "uma inferência de que o que é verdade em certo caso também é verdade em um caso de algum modo semelhante, mas não exatamente paralelo, isto é, não semelhante em todas as circunstâncias materiais. Um objeto tem a propriedade b; outro não tem a propriedade b, mas é semelhante ao primeiro em uma propriedade a não ligada a b; a A. levará à conclusão de que esse objeto também tem a propriedade b. P. ex., diz-se que os planetas são habitados porque a Terra é habitada". Esse modo de argumentar pode, segundo Stuart Mill, aumentar só em grau não determinável, mas em todo caso muito modesto, a probabilidade da conclusão; mas em compensação, pode dar lugar a muitas falácias (Logic, V, 5, 6). Mas a lógica e a metodologia atuais são muito menos céticas em relação à A. talvez porque a remetam ao significado \", isto é, à igualdade de relações. P. ex., um dos procedimentos analógicos consiste na criação de símbolos que tenham semelhança maior ou menor com as situações reais, e cujas relações reproduzam as relações inerentes aos elementos de tais situações. Tais símbolos são, às vezes, modelos mecânicos, quer dizer, desenhos, esquemas ou máquinas que reproduzem as relações existentes entre elementos reais; tais são, p. ex., os modelos do sistema solar, da estrutura do átomo, do sistema nervoso, etc. Outras vezes, tais modelos são obtidos através do chamado processo de extrapolação, que consiste em levar ao limite o comportamento de um conjunto de casos ordenados numa. série na qual se suponham eliminadas, gradualmente, as influências perturbadoras. Fala-se, p. ex., em velocidade infinita ou em velocidade zero, ou massas reduzidas a um ponto geométrico, em alavancas perfeitas, em gases ideais, etc. Todo modelo é um exemplo de A., no sentido le, por ser próprio de um modelo reproduzir, entre os seus elementos, as mesmas relações dos elementos da situação real. Mas os físicos também falam hoje de A. como de condição ou de elemento integrante das hipóteses e das teorias científicas. Segundo essa orientação, a A. faz parte da constituição de uma hipótese na medida em que "as proposições de uma hipótese devem ser análogas a algumas leis conhecidas": nesse sentido, a A. não é só um auxílio à formulação de uma teoria, mas é parte integrante dela. "Considerar a A. como um auxílio à invenção das teorias é tão absurdo quanto considerar a melodia um auxílio para a composição de uma sonata. Se, para compor música, só fosse necessário obedecer às leis da harmonia e aos princípios formais de desenvolvimento, todos seríamos grandes compositores; mas é a ausência do sentido melódico que nos impede de atingir excelência musical simplesmente comprando um manual de música" (N. R. CAMPBELL, Physics; The Elements, 1920, p. 130). A A. corresponderia, portanto, em física ao que é o sentido musical em música: garantiria a adequação de uma hipótese científica às uniformidades expressas ou formuladas nas leis. |
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