Quando um ato pode ser considera imoral? Por que determinados atos são considerados moralmente corretos? Por que não se aplicam os critérios morais sobre alguns atos? Essas três indagações são o norte da reflexão sobre moralidade, imoralidade e amoralidade. Estão também, no âmbito da discussão sobre os elementos constitutivos do ato moral.
É verdade que podemos dizer que qualquer ato é um ato moral. Isso, entretanto deve ser bem entendido, para não cairmos no subjetivismo, aceitando tudo e a tudo justificando. Na discussão de problemas éticos, não se aplica o princípio maquiavélico de que os fins justificam os meios. Para que o ato possa ser considerado moralmente bom deve partir de um princípio bom, ser executado com instrumentos (meio) bons e direcionar-se para um fim bom. Portanto o começo o meio e o fim devem ser mantidos pelo mesmo norte: o bem.
A busca pelo bem se constitui um dos problemas enfrentados pela Ética. E nesse ponto nos deparamos com um problema filosófico colocado por Sócrates e que permanece presente em nossas discussões: o que é o bem? O que é bom? Aquilo que é considerado como bem/bom, por alguns, pode ser considerado algo mau, negativo por outras pessoas? Ou existe um bem/valor supremo?
A partir da reflexão Socrática e, posteriormente, Aristotélica podemos concluir que o bem manifesta-se nos fenômenos ou nas ações humanas. As pessoas que realizam ou que executam as ações as fazem porque as consideram coisas boas. Podemos acrescentar que as pessoas não realizam nada que, para si, não seja bom, da mesma forma que fogem daquilo que consideram um mal. Postura que é corroborada pela afirmação de Nietzsche(a) (2005), dizendo que “foram os próprios ‘bons’, os homens nobres, os poderosos, aqueles que ocupam uma posição de destaque e têm a alma elevada que julgaram e fixaram a si e a seu agir como ‘bom’, ou seja, ‘de primeira ordem’, em oposição a tudo o que é baixo, mesquinho, comum, plebeu” (Nietzsche, 2006 (a) p. 25)
Além disso, a darmos atenção ao princípio afirmado por Nietzsche (a) (2005), verificaremos que a busca pelo bem se desenvolve a partir do estabelecimento de princípios ou de normas. “Disso se segue que não há ‘justo’ e ‘injusto’, senão a partir do momento da instauração da lei. Falar de justo ou injusto em si não tem sentido, porque uma infração, uma violação, uma espoliação, uma aniquilação não podem ser injustas em si, uma vez que a vida procede essencialmente por infração, violação, espoliação, aniquilamento e não podem ser pensadas sem essa característica” (Nietzsche, (a) 2005, p. 72).
Com isso podemos dizer que a ética, como reflexão sobre os atos morais, só pode ser entendida como uma reflexão das práticas humanas. As ações humanas são o objeto da reflexão ética. Essa reflexão desenvolve-se a partir de alguns critérios. A ação humana para ser julgada – pois é dessa forma que sobre ela se exerce o juízo moral – a fim de ser considerada como ação moral ou imoral, deve passar pelo crivo da consciência, da vontade, da responsabilidade e da liberdade. Sem que o agente moral goze, pelo menos, destas quatro prerrogativas o ato por ele realizado não tem como ser julgado nem como ser classificado.
Entretanto não se pode esquecer a máxima nietczcheana de que “as morais nada mais são que a linguagem figurada das paixões” (Nietzsche, 2005, p. 99). Ou seja fazer um julgamento dos atos morais é, ao mesmo tempo, estabelecer os limites entre o certo e o errado; é satisfazer uma vontade dominante, a vontade que determinou a diferença entre o certo e o errado.
Noutras palavras o estabelecimento dos juízos morais são uma das formas não de ampliar a liberdade humana, como se apregoa largamente, mas um caminho para estabelecer as limitações para o agir humano. A ética, portanto é o processo humano pelo qual o ser humano procura a compreensão das limitações e sanções que se impôs ao longo da história; limitações e sanções que ao nortearem a sociedade humana, possibilitou a subsistência e permanência do ser humano vivendo em grupo. A vida grupal é uma vida que se mantém a partir do estabelecimento de normas, de leis, de regras. E, novamente, são de Nietzsche, as palavras esclarecedoras, afirmando que: “Toda moral é, em oposição ao laisser aller (deixar correr), uma espécie de tirania contra a ‘natureza’ e também contra a ‘razão’. Mas isso não pode servir de objeção contra ela, se não fosse preciso decretar, em nome de outra moral, qualquer que fosse, que toda tirania e irracionalidade são interditas, O que há de essencial e de inapreciável em toda moral é que é uma coação prolongada” (Nietzsche, (b) (2005), p. 99
NIETZSCHE, F. (a) A Genealogia da moral. S Paulo: Escala, [2005?].
NIETZSCHE, F. (b) Além do bem e do mal. S Paulo: Escala, [2005?].
Nenhum comentário:
Postar um comentário